domingo, 28 de novembro de 2010

Amigos, amigos e o nome que quisesse

Era um garoto que perdeu os pais, não se sabe exatamente quando, mas foi quando este ainda era um bebê. Suas lembranças da infância sempre se aliavam ao orfanato onde morava. Sua data de nascimento era desconhecida e continuou assim: sem casa, sem data e sem família.

Aos 16 anos, consegue um emprego, e ainda era abrigado. Com o passar do tempo, melhoria salarial e promoções no emprego, o jovem alugou um canto pra morar. 18 anos.

Nessa época, ele ainda estudava, tinha alguns colegas e poucos amigos. Com um lugar que chamava de seu e grana no bolso, ele saia, se divertia e voltada despreocupado. - Não estou mais num orfanato. – pensava ele.

Apesar dos pesares, foi um garoto bem criado. Era educado, nunca se envolvera com drogas, vandalismo ou qualquer coisa do tipo. Voltemos a falar dos amigos...

Vez ou outra ele era convidado para festas tradicionais, e as que mais lhe causava impacto, eram os aniversários. Isso por ele não ter sua própria data comemorativa. E isso o entristecia. Não só pelo fato de sua data de nascimento ser desconhecida, mas também por ver a demonstração de afeto que aqueles aniversariantes tinham, através de presentes que ganhavam. Pensou em um modo de acabar com aquela frustração pessoal...

Terminou os estudos, e, como é quase tradição, aquelas amizades que fez em época de colégio, acabaram lentamente após as últimas provas. Quase 20 anos.

Soube da grande oportunidade de empregos na capital do estado, e foi pra lá tentar... Conseguiu. Ali se instalou rapidamente, e com o novo emprego, nova moradia, nova cidade, veio também novos conhecidos. E aquela tristeza que surgia em ‘datas queridas’ estava ali, pronta pra ser emergida. – Já sei como acabar com isso. Vou driblar todos esses anos, de aniversários perdidos. – pensou o astuto.

Para os colegas de trabalho ele era: Michael, 21 anos, nascido em 15 de Março do 21° ano atrás. Janeiro.

Com o tempo correndo, o número de amizades foi crescendo. Um amigo apresenta outro, que o apresenta a outro, e a outro, que já nem conhece aquele primeiro amigo, da primeira apresentação. Com isso ele formou diferentes grupos de amigos.

Ia à igreja, e lá ele era Felipe: 22 anos, nascido em 30 de Outubro do 22° ano atrás. Entre os amigos esportistas era Fred: 20 anos, nascido em 24 de Julho do 20° ano atrás. Entre as patrícias, da vila chique, do lado de lá da cidade, era Gabriel: 20 anos, nascido em 15 de Janeiro do 20° ano atrás. Com isso, o jovem já tinha várias identidades e várias datas de aniversário.
O problema disso não era organizar as festas, ou guardar os presentes. Essa era a parte que lhe proporcionava prazer. Manter o sigilo, lembrar das respectivas datas relacionadas a cada roda de amigos, e ser um bom ator era o que lhe causava preocupação. Ousou usar diferentes nomes pra não ser citado por algum amigo para outro amigo, de uma roda de amigos diferente, sendo que aqueles amigos, não se conheciam. Era muito sigilo.

Assim, ele, ao qual o nome ninguém sabe realmente, tinha suprido todo o déficit de atenção, relativo a aniversários que teve ao tempo de sua infância, conseguiu o que queria, mas no fundo, lá no fundo, ainda persistia...

Era triste realmente não saber quem ele era, qual o seu nome verdadeiro, aquele que sua mãe (ou pai) lhe dera e qual a data, que pra todos, anualmente, se aproxima lentamente, e às vezes nos enche de ânsia com a espera.

Concluiu Michael (Felipe, Fred ou Gabriel) que o que ele buscou em toda sua vida, antes mesmo da sobrevivência, foi o afeto. Ele quis ser querido. Ele quis ter amigos. Ele quis alimentar o ego. É natural...

A falta na infância e o excesso na juventude o fizeram, por fim, uma pessoal mal.
O seu nome, ele mente. É querido, mas carente. É autor, mas se passa por inocente. Sigilosamente... Ele era quem ele quisesse.

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